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16 de novembro de 2016

Descobrindo a música contemporânea

A música contemporânea tem um vasto repertório a ser descoberto! Criado em abril de 2016, como parte da Escola Municipal de Música, o Ateliê Contemporâneo encerra, no dia 17 de novembro, às 20h, as apresentações deste ano da Série Música Contemporânea na Sala do Conservatório. Ingressos aqui.

Os músicos – Alexandre Lunsqui, Lucas Albuquerque, Thales Del Comune, Danilo Rossetti e Tiago Gati – descrevem as obras que serão apresentadas.

Périodes (1974) para sete instrumentos – Gérard Grisey
Estreia nacional

Esta, ao que tudo indica, é a estreia nacional de Périodes, obra que integra o ciclo Les espaces acoustiques, formado por seis obras para diferentes formações instrumentais compostas por Gérard Grisey entre 1974 e 1985. Grisey (1946 – 1998) foi um compositor que integrou a corrente espectral francesa, movimento que surgiu em meados dos anos 1970 com uma direção oposta ao estruturalismo que dominou as vanguardas europeias ao longo do século 20. Grisey afirmava que seu modelo composicional era essencialmente “o som”, procurando, através de sua escrita musical, desvelar o universo microfônico do interior sonoro, a partir do estiramento de suas durações. Neste contexto, o “tempo do som” se sobrepõe ao tempo métrico das pulsações, dando vida aos timbres instrumentais que são explorados e interpolados gradualmente.

Danilo Rossetti, compositor.

Toy (2013) de Alexandre Lunsqui

A palavra ‘toy’ significa brinquedo. Na peça, o ensemble é o brinquedo. A ideia nasceu enquanto eu observava uma criança se divertindo com seus brinquedos. Normalmente um brinquedo é algo que serve a uma função bem simples: entreter e divertir a criança. No entanto, notei algo muito mais profundo e que envolvia explorar o brinquedo de maneiras totalmente inusitadas e que iam muito além de sua previsibilidade. O imaginário da criança não se restringiu somente ao brinquedo em si, mas também com a expectativa criada pelas pessoas ao redor. Dessa forma, a criança e seu brinquedo criam todo um teatro de ações: além da diversão, ela cria e testa as reações das pessoas num processo dinâmico e complexo.

Nessa peça, eu faço uma citação do Concerto para 13 instrumentos de Ligeti. Para mim, Ligeti foi um compositor do século 20 que soube “brincar” com os sons à sua maneira: o lúdico e o complexo coexistem em sua obra. Em “Toy”, também procuro explorar esses dois lados.

Alexandre Lunsqui, compositor.

Enemy: Time (2016) de Thales Del Comune

“A vida foge e não recua um passo”. Tendo este soneto de Petrarca como referência, Enemy: Time se desenvolveu a partir das angústias pessoais do autor em relação ao próprio ato de compor e com as conveniências estabelecidas no cenário da música contemporânea. A obra existe em duas partes, uma musical que aborda processos aleatórios, polimétricos, defasagens e loopings, e outra escrita, que na partitura se desenvolve como um diário de composição e de reflexão sobre sentimentos essenciais e imorais, reverenciando os trabalhos de Marquês de Sade, Georges Bataille e Anaïs Nin.

Thales Del Comune, compositor.

Strata (2016) de Tiago Gati

Strata (que significa camadas sobrepostas, plural do termo em latim Stratum) faz referência aos inúmeros estratos de material sonoro que foram utilizados para a construção da peça. Extrato, com grafia diferente, também proveniente do latim (extractu), significa uma coisa que se extraiu de outra, ressaltando um segundo aspecto importante da peça: a incorporação de elementos musicais provenientes de outros contextos, mais ou menos amalgamados, mesclados no corpo da obra. Esses elementos por vezes destacam-se perceptíveis aos nossos ouvidos, por outras formam uma camada tão submersa que se diluem no tecido instrumental. Como um corte feito no solo e constituído de camadas sobrepostas, esses estratos trazem características diversas, com origens muitas vezes longínquas, como traços de vidas que um dia ocuparam um espaço e que ali permaneceram, construindo um campo fértil possível.

Tiago Gati, compositor.

Pribaoutki (1914) de Igor Stravinsky

Ao nos referirmos a Igor Stravinsky, termos como complexidade rítmica, Sagração da Primavera e Ballets Russes vêm à nossa memória. De fato, Stravinsky dizia: “A marcação dos tempos é o item principal. Uma peça minha pode sobreviver a quase tudo, exceto a um andamento errado ou inseguro. ” Pribaoutki, ciclo de quatro curtas canções folclóricas concebidas para barítono, embora frequentemente executadas por mezzo-sopranos ou contraltos, une esse apreço ao rítmico com o texto de versos russos em canções folclóricas.

Composta em 1914, no início da Primeira Guerra Mundial, a obra confronta a acentuação da palavra com a métrica musical, o que levou o compositor a dizer que esta foi uma das descobertas mais felizes de sua vida. Vale ressaltar que essa peculiaridade era presente na música folclórica russa do início do século 20 e notada por linguistas da época: o texto poderia ser ajustado de acordo com as necessidades musicais.

Lucas Albuquerque, regente.